quinta-feira, 3 de dezembro de 2009



Saudades!!!

Dezembro chegou e veio trazendo muita água, dizem os mais velhos que quando inicia assim será chuva ate o dia 15. Mas ele também trouxe tristeza, aprendizado e conhecimento. Sendo o ultimo mês do ano trouxe suas águas para lavar a alma daqueles que estão aflitos, carentes, solitários, ou quem sabe abrandar o coração dos mais arrogantes, lavar as lagrimas derramadas por um amor que se foi que se perdeu em algum lugar no tempo.
O que será que ele quer me dizer¿
Uma saudade sem fim do meu rio d´ouro que tantas vezes aliviou minhas angustias, tristezas e saudades de pessoas tão queridos. Fico aqui na cidade grande, na selva de pedra a imaginar se ele esta bravo ou calmo como uma criança adormecida.
Penso em minhas flores! Na minha casinha em cima do morro e no banco da mentira onde tantas vezes sentei e pensei nos entes queridos.
Sinto que às vezes ouço vozes como a do meu amigo Zé Sena a me dizer: Volte menina, assim como sentes falta do rio ele também chora por você na foz do d´ouro, e me angustio por me ver presa as artimanhas do destino.
Que venham as águas e que levam toda dor!

Paula Meirelles

sábado, 5 de setembro de 2009

Adeus velho Bananeira



A mais ou menos 15 anos conheci o cumpadre bananeira, índio de sorriso largo e cheio de historias para contar.
Hoje recebi com imensa tristeza e dor a noticia de sua morte. As lembranças logo me vieram à cabeça, sua imagem sempre com o sorriso aberto a nos receber com tanta hospitalidade, as caicumadas que tomei em sua aldeia, as festas que tive a honra de participar.
Hoje seu povo chora sua perda assim como eu e todos que tiveram a honra de conhecer uma alma tão pura como a sua.Conforta-me saber que estais sendo recebido com festa por teu povo em outro estagio mais avançado, os grandes querreiros os aguardam para La te darem toda honra que merece, o que não aconteceu aqui no nosso mundo, no mundo dos brancos, dos hiracothos.
Você foi um marco na minha vida, na minha historia como indigenista.Fica aqui um imenso pesar, uma saudade do tamanho de uma samauma do meu velho cumpadre bananeira.
Ratana!!

Paula Meirelles

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Viver no D'Ouro


Estou agora de passagem pelo município de Jordão. Cheguei no final da tarde de ontem para denunciar ao delegado de polícia a presença de invasores na Terra Indígena Tarauacá. Invadem-na para caçar e pescar. Não posso fazer nada além de denunciar e exigir providências. Não tenho homens suficientes para expulsá-los.

Minha atividade como indigenista foi mesmo a melhor opção de minha vida. Cada vez mais me dou conta do quanto a vida na cidade é um caos. Há quase cinco anos fui para a Frente de Proteção Etno-Ambiental do Envira, onde o sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior, meu pai, é chefe há quase 20 anos.

Passei dois anos com ele. Quando foi flechado eu estava lá e o socorri. Aquele domingo ainda está bastante vivo na minha memória. Como bom escritor que é, meu pai fez uma relatório intitulado “As lições do domingo”. Até hoje não consigo terminar de ler sem me emocionar, afinal o "velho do rio" nasceu novamente.

Há três anos foi aberto o posto da Foz D’Ouro e logo assumi a chefia. Confesso que no começo não gostei. Para chegar ao posto gastei três dias numa canoa com o rio seco, literalmente. Minha vontade foi de voltar imediatamente, acostumada com o rio Envira, que é navegável o ano todo. Jamais imaginei que o Tarauacá fosse assim.

Passado um mês no posto, fui me apaixonando pelas belezas que aqui encontrei. Gradativamente, comecei a enxergar com outros olhos essa nova terra. O rio com seus repiquetes, levando tudo e todos a sua frente, passou a merecer o meu respeito. Aprendi que tudo tem seu tempo e sua hora, que basta cessar as chuvas para ele voltar a ser manso novamente.

Por aqui, o entardecer nos convida a pensar na vida, a sermos mais humildes diante da natureza. Além disso, é bom colher a fruta no pé e saborear, ir à praia cheia de melancia e comer até a barriga doer ou sentar no "banco da mentira" e contemplar o infinito do horizonte com tantas cores.

E o rio segue correndo como se já soubesse tudo da vida. E ele sabe. As pessoas perguntam como é viver no D'Ouro, mas não dá pra explicar muito com palavras. Seria necessário que pudessem enxergar através de meus olhos. Talvez alguns mais atentos encontrariam a resposta. Mas posso afirmar que aqui é mais que o paraíso.

Fiz um pacto de cuidar do rio e ele por sua fez cuida de mim, aliviando minhas angústias e saudades, deixando-me mais próxima das pessoas que amo. É assim que tento explicar um pouco a minha vida no D’Ouro.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Um Bom Lugar




Paula Meirelles

As pessoas podem pensar que no D'ouro todos os dias são iguais. Que nada. O rio nunca é o mesmo. Todos os dias ele muda, um dia mais cheio, outro mais seco, uma praia encoberta, outra que aparece, mas para se perceber esses pequenos detalhes é preciso estar em sintonia com ele, com esse lugar que a cada dia me surpreende e que me faz agradecer, por estar viva, por estar aqui apreciando tanta beleza.
Agora o inverno chegou com toda sua força, não se vê mais as mutambas floradas que enfeitam a floresta de cor-de-rosa no verão. As chuvas são constantes, mas, existe beleza no inverno, apesar dos dias serem quase sempre nublados e chuvosos. As flores desabrocham a olhos vivos, os roçados, parecem vibrar de tanta alegria quando a chuva cai, alimentando até a plantinha mais miúda que existe.
Os pequenos igarapés começam a alimentar o rio com água às vezes mansa, outras vezes com tanta voracidade, que faz a foz estremecer.
Nesses dias nublados, há quem possa sentir alguma melancolia. Eu, pelo contrário, adoro. Como já disse Djavan "um dia frio, um bom lugar para ler um livro" e isso tenho com certeza.
Atrás do barracão forma uma lagoa, os patos adoram e me perco nas horas vendo-os se banharem com tanta felicidade.
São esses pequenos detalhes do meu dia-a-dia que me encantam e me fazem apaixonar cada vez mais pelo D'ouro, coisas assim que no corre-corre da vida urbana, passam despercebidos, pois as pessoas sempre ocupadas, sempre correndo, não têm oportunidade para apreciar as belezas que a vida oferece cada dia e sempre diferente dia após dia.